domingo, 28 de junho de 2009

A Nova Mulher e a Moral Sexual

Dois textos compõem esta obra. O primeiro (1918) apresenta uma crítica à situação da mulher na sociedade burguesa, comprimida por um código moral em que a propriedade privada era - e ainda é - prioridade, a ela tudo se sujeitando. O segundo (1921) trata da necessidade de uma reorientação no comportamento do homem e da mulher, partícipes da nova estrutura social que a revolução bolchevique engendrou... um amor-companheiro, com direitos e responsabilidades iguais, com respeito à individualidade, com apoio mútuo... Alexandra Kolontai nos mostra que as desigualdades entre os sexos e todas as formas de dependência da mulher em relação ao homem somente desaparecerão com o advento de uma nova sociedade e, conseqüentemente, de uma nova cultura.

" O novo tipo da mulher, que é interiormente livre e independente, corresponde, plenamente, à moral que elabora o meio operário no interesse de sua própria classe. A classe operária necessita, para a realização de sua missão social, de mulheres que não sejam escravas. Não quer mulheres sem personalidade, no matrimônio e no seio da família, nem mulheres que possuam as virtudes femininas - passividade e submissão. Necessita de companheiras com uma individualidade capaz de protestar contra toda servidão, que possam ser consideradas como um membro ativo, em pleno exercício de seus direitos, e, conseqüentemente, que sirvam à coletividade e à sua classe.A psicologia da mulher do novo tipo, da mulher independente e celibatária, reflete sobre a das demais mulheres que permanecem ainda na retaguarda em relação a seu tempo. Os traços característicos, formados na luta pela vida, das trabalhadoras convertem-se pouco a pouco, gradativamente, nas características das outras mulheres que ficaram atrasadas.
Pouco importa que as mulheres trabalhadoras sejam apenas minoria, que para cada mulher do novo tipo haja duas, talvez três mulheres pertencentes ao tipo antigo.
As mulheres trabalhadoras são as que dão tom à vida e determinam a figura de mulher que caracteriza uma época determinada.

As mulheres do novo tipo, ao criar os valores morais e sexuais, destroem os velhos princípios na alma das mulheres que ainda não se aventuraram a empreender a marcha pelo novo caminho. São estas mulheres do novo tipo que rompem com os dogmas que as escravizavam.A influência das mulheres trabalhadoras estende-se muito além dos limites de sua própria existência. As mulheres trabalhadoras contaminam com sua crítica a inteligência de suas contemporâneas, destroem os velhos ídolos e hasteiam o estandarte da insurreição para protestar contra as verdades que as submeteram durante gerações. As mulheres do novo tipo, celibatário e independente, ao se libertarem, libertam o espírito agrilhoado, durante séculos, de outras mulheres ainda submissas".
Alexandra Kolontai

quinta-feira, 25 de junho de 2009

Medo da Verdade

A história começa no bairro de Dorchester, em Boston, onde as ruas povoadas por pessoas da classe operária abrigam famílias destruídas e sonhos despedaçados. É ali que Amanda McCready, de quarto anos desapareceu sem deixar vestígios. A polícia não foi capaz de encontrar nem mesmo uma única pista; então, os tios de Amanda, desesperados, contratam os detetives particulares locais, Patrick Kenzie e Angie Genarro, para ajudarem na condução do caso. Apesar de estarem um pouco hesitantes em aceitar a investigação, Patrick e Angie conhecem a vizinhança e acabam conhecendo também a verdade sobre Helene, a mãe viciada em drogas de Amanda

Ao se aprofundarem em sua história, eles se vêem em um caminho que os leva ao coração sombrio de Dorchester e através de traficantes, ex-presidiários e pedófilos, mas que não os aproxima de Amanda. Em meio aos holofotes da mídia, eles unem forças com o determinado detetive Remy Bressant e com o capitão de polícia Jack Doyle – entretanto, justo quando parece que o caso emocionalmente intrincado está para ser solucionado, ao disparar de uma arma, o triste destino de Amanda é revelado. Enquanto todos tentam seguir em frente com suas vidas, um assombrado Patrick não consegue esquecer. Conforme insiste através das pistas que tem, ele se vê preso em uma teia de mentiras cada vez mais intrincada, em meio à violência inexplicável e ao chocante segredo que esconde a verdade e que o leva a enfrentar um dilema moral que o deixará, e também o público, se questionando o que de fato é certo.

quarta-feira, 24 de junho de 2009

Grey Gardens

Este documentário é um fruto do acaso. Os irmãos Maysles pretendiam rodar um filme sobre a irmã de Jacqueline Kennedy Onassis, quando conheceram a história da tia e da prima da ex-primeira dama. As duas, que já foram frequentadoras da alta sociedade nova-iorquina, moravam à época numa mansão caindo aos pedaços. Mãe e filha estavam falidas, isoladas e viviam de seu passado. Ou das cinzas dele. Esta história ganhou a catapulta de um escândalo: sem limpeza, o lugar começou a feder e incomodar os vizinhos. A prefeitura deu um ultimato para as duas: ou limpam ou saem. A imprensa fez festa e Jackie Kennedy ajudou a dar um tapa no lugar. É aí que entram os Maysles. Quando descobriram a história, desistiram do projeto anterior e embarcaram neste saborosíssimo mundo.
Os irmãos conquistaram a confiança de Big Edie e Little Edie e passaram dias e dias filmando o cotidiano das duas. "Big Edie" e "Little Edie" são interpretadas por Jessica Lange e Drew Barrymore. À mesma medida em que mostravam a decadência da família, acompanharam a degradação psíquica de mãe e filha. O documentário adota uma política pouco intervencionista em relação a seu objeto. A equipe tenta interferir ao máximo no dia-a-dia das duas e as informações sobre sua história, a não ser por uma breve sequência de recortes de jornais, saem das bocas perturbadas das retratadas. A opção tem duas consequências imediatas: por um lado, as entrevistadas ficam mais livres e tecem sua própria narrativa sobre os 50 anos em que viveram naquela casa e os desdobramentos de suas vidas. Por outro, falta informação.

Sem intermediadores - os Maysles falam com elas pouquíssimas vezes -, as Bouvier Beale costuram sua própria história por conta das memórias perturbadas. Contam o que querem contar e percebem claramente quando estão agradando, então, seu mundo paralelo entra em cena deixando completamente incertas as versões dos fatos. A ideia dos cineastas provavelmente era a de deixar este mundo vir à tona. Uma mãe e uma filha loucas, presas numa dimensão à parte, são certamente bem mais interessantes do que duas ricaças decadentes, mas a desordem causada pela falta de elementos mais palpáveis para basear a história incomoda. No final, o trabalho dos Maysles não tem nada de muito especial. Sua importância foi apenas a de nos revelar as personagens e deixar elas falarem por si.

terça-feira, 23 de junho de 2009

Milagre em Sta. Anna

Quando poderia passar da conta no realismo e transformar Milagre em Sta. Anna em um filme de ação com o subtexto da guerra, Lee empurra o filme para a ironia e para um sentimento de humanismo. Ora somos tomados pelo suspense, outras pela dor. Ora nos indignamos com uma traição, em outros momentos nos emocionamos com a capacidade de abstração de um soldado. Isso porque a trama principal envolve os milicos negros, mas o roteiro de James McBride (que também é autor do livro que inspira o filme) traz outras subtramas. O mérito de transitar esses gêneros, tomando todo o cuidado em criar a ambientação necessária a nós, os espectadores, é de Lee. Tantas coisas acontecem em Milagre em Sta. Anna que se torna muito difícil nos desconectar nas mais de duas horas de projeção. Lee mostra que ainda tem muitos recursos artísticos e coloca um ponto de interrogação positivo sobre o que estará por vir na carreira do combativo, e controverso, cineasta.
Mesmo com 160 minutos de duração, há poucas cenas de combate no filme. Porém, tais sequências são bem vívidas, com a violência da guerra retratada em corpos mutilados.
As fortes imagens são apenas um dos recursos que Spike Lee usa para emocionar. Quem não for muito fã de exageros pode não gostar do filme. Por outro lado, quem se dispuser a mergulhar nos dramas exibidos, com certeza sairá da sala de projeção com o coração arrebatado.

A música composta por Terence Blanchard – que já tem uma parceria duradoura com o diretor – é outra ferramenta em busca de fortes emoções. Os nerds com certeza se lembrarão de um grande título sobre a Segunda Guerra Mundial: a franquia de jogos Medal of Honor.

A direção de fotografia de Matthew Libatique (Homem de Ferro) também merece elogios. A iluminação competente une-se aos enquadramentos bem planejados pelo diretor para criar imagens que parecem quadros lindos. Trata-se, porém, de uma beleza macabra, já que muitas vezes o sangue dos soldados serviu de tinta para essas gravuras.